7.9.06

Saga da Boneca Preta

No último natal, na hora de comprar os presentes das sobrinhas, passei um bocado de tempo imaginando como adquirir o que as garotas gostam, pelo menor preço possível (estava meio dura naquela época, assim como hoje)...daí que, numa loja bonitona do Rio Sul, encontrei bonecas capazes de deslumbrar qualquer garotinha por módicos vinte reais. Ok, Ok...eram Barbies...a boneca mais patética da face da Terra...se eu tivesse dinheiro suficiente, jamais brindaria à tolice presenteando as meninas tão mal, mas...

Eu também já tive Barbie (Uma. E era a amiga da Barbie), e nem por isso me tornei uma bobona. A boneca, por si só, é inofensiva. Mas há nela, implícito, uma mensagem, assim como todas as coisas do mundo são plenas de significados. Sejam tão magras quanto puderem, tenham os peitos como melões maduros, tenham estonteantes madeixas loiras...para que possam ser lindas, desejadas e admiradas. Ser uma Barbie é atingir o patamar da perfeição, ela é a personificação do que uma mulher deve verdadeiramente ser: sofisticada, um guarda roupa fantástico, carrão, mansão, uma namorado (assexuado?!?) rico e musculoso...

Somando as bonecas da nossa infância às doideiras do mundo adulto, a nos bombardear com suas idéias de beleza e mil modismos, o que resta à mulher senão se curvar inocentemente às exigências quanto ao seu corpo? Resta, ao menos, a consciência do que fazemos e o porquê...

Escolhi duas Barbies, uma negra e outra morena. Ambas gatíssimas, surfistas, bronzeadas, roupitcha da hora! E devo admitir que a beleza da negra me entusiasmou, quer dizer, eu quis muito que a minha sobrinha de seis anos tivesse uma daquela...olhos imensos cor caramelo, lábios tipo Angelina Jolie e uma vasta cabeleira Black Power (puxa, depois de uma infância inteira com os anúncios das louríssimas veiculados na tv, finalmente modelos diferentes chegam ao mercado). A amiga que estava comigo não ficou tão entusiasmada e foi taxativa: a criança ia se desinteressar pela boneca em dois tempos, simplesmente porque não é modelo de beleza na cabeça da garotada, o modelo continua a ser a "beldade loira cabelo armado amarelo esvoçante". E como a criança possivelmente, sabe-se Deus, talvez não ganhase mais nada de ninguém, e vendo a irmã com a boneca de seus sonhos, pois bem...levei a morena, por puro desencargo de consciência.

Houve um tempo, ao longo da meninice, que imaginava se existia uma loja especial para bonecas pretas...tinha uma menina lá no meu prédio que tinha uma bonequinha igualzinha às demais (mesmo nariz, olhos, boca), com a grande excessão de que seu corpo de borracha era preto. E era seu xodó, essa boneca preta da minha amiga querida (aliás, bjs para você, minha primeira leitora)...

se você for numa loja, hoje, é possível que encontre uma ou outra, mas nos anos oitenta e meados de noventa era realmente muito difícil, uma raridade. A Xuxa era o grande barato da época e depois vieram Eliana, Angélica e outras Loiras que eram a alegria da criançada. Como um país cuja população negra esbarra nos 47%, não vende bonecas negras? Há algo de muito errado, minha gente. Nós não estamos acostumados a ver graça fora dos padrões de beleza branca, em todas as instâncias.

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